É preciso agir contra a destruição do mundo do trabalho
O jornal Valor trouxe esta semana uma reportagem que é um alerta à sociedade. Através da análise resultante do cruzamento dos dados da PNAD (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio Contínua) com uma pesquisa da Universidade de Oxford (Inglaterra) ambas sobre o futuro do trabalho, está previsto o fim de 52 milhões de empregos nas próximas duas décadas devido ao incremento da automação no Brasil. Se de um lado a tecnologia, via de regra, oferece oportunidades de melhoria da qualidade de vida, por outro acena para modificações que impactam o sustento de milhares de pessoas. Nisso tudo, como age o governo brasileiro? Retirando direitos e proteção as trabalhadoras e trabalhadores.
Àqueles que dizerem que o mercado deve ser livre, sem “intervencionismo”, percebam que citei aqui propositalmente duas economias capitalistas.
Em nosso país, desde 2016, reverteu-se a tendência de garantir a proteção social e o distributivismo por um modelo ultra-neoliberal. As reformas trabalhistas de 2017 e a minirreforma de 2019 não só tiveram como foco a redução de garantias e proteção aos trabalhadores e trabalhadoras, como enfraqueceram o sistema de proteção e defesa constituído pelos sindicatos e organizações sociais.
Trabalho intermitente, negociação direta, entre outros, fragilizaram o potencial reivindicatório; a reforma previdenciária, agora aprovada também pelo Senado, aumenta o tempo de trabalho e de recolhimento para acesso à aposentadoria da maioria das categorias, abala em profundidade o sistema público e tem como tendência a capitalização.
O projeto introduzido em 2016 a partir do golpe disfarçado de impeachment, e que se aprofundou com Bolsonaro, vê a substituição de trabalhadores por máquinas como uma simples forma de elevação de lucros. É a mesma visão que acha natural rotular reservas ambientais e reservas como entraves ao desenvolvimento, fazendo parte desta lógica predatória do trabalho.
A financeirização da economia com a quebradeira de setores inteiros e monetização da vida se transformam hoje numa realidade drástica aos trabalhadores. Atualmente temos cerca de 38,8 milhões de pessoas que trabalham na informalidade e 11,8 milhões desempregados.
Daí porque o alerta de pesquisadores soa muito forte no Brasil, que deveria estar se preparando para este cenário, de modo a enfrentar a desigualdade e precarização e não o contrário como faz hoje. Pois uma tendência não é decretação de destino, mas uma sinalização do que pode advir conforme a conjuntura política e econômica de cada país.
Talvez não seja possível frear a tendência ao avanço das tecnologias no mundo do trabalho, sequer desejável. Mas há mecanismos legais e tecnologias sociais que podem ser incrementados, como a proteção ao trabalho, a reconversão de funções com o aumento no nível de escolaridade voltada para a ciência e a tecnologia, criação de redes de apoio que permitam a melhor divisão sexual do trabalho
A circulação de ideias ultrapassadas, anteriores ao Iluminismo, que negam o avanço da história e da ciência, propõe um lugar secundário às mulheres, trata trabalhadores como boçais e vagabundos, não fará, jamais, a confrontação para garantir o emprego a quem precisa.
Diante deste grave alerta feito pelo estudo, a reversão do quadro perverso e ameaçador a milhões de trabalhadoras e trabalhadores no Brasil nos remete à necessidade de reconstruir um projeto de desenvolvimento que articule o econômico e o social, com muita democracia e cidadania ativa. É hora de mudar.
Publicado em Sul 21