Debate sobre maioridade penal na Câmara dos Deputados é adiado após confusão com manifestantes e até uso de spray de pimenta
Em uma sessão tumultuada, que chegou a ser suspensa após a Polícia Legislativa usar gás de pimenta contra estudantes, a comissão especial da Câmara dos Deputados responsável para avaliar a maioridade penal adiou a votação, prevista para quarta-feira (10), para o dia 17 deste mês, a votação do projeto da PEC (proposta de emenda à Constituição) que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos.
O relatório do deputado Laerte Bessa (PR-DF) foi lido depois de a reunião ser retomada a portas fechadas, em outro plenário da Câmara, mas houve pedido de vista coletivo. A sessão começou com ânimos exaltados e com a tentativa de deputados do PT, contrários à medida, de adiar a votação. A sala onde era realizada a reunião foi tomada por dezenas de integrantes da UNE (União Nacional dos Estudantes) e da Ubes (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), que entoaram palavras de ordem contra o projeto.
Quando Bessa estava iniciando a leitura de seu relatório – que defende a punição, como adulto, de todos os jovens a partir de 16 anos que cometerem crimes –, os estudantes voltaram a protestar, chamando alguns deputados de fascistas. O presidente da comissão, André Moura (PSC-SE), ordenou então que a Polícia Legislativa esvaziasse a sala.
Os estudantes se recusaram a sair e teve início um bate-boca entre eles e deputados favoráveis ao projeto. No meio da confusão, o parlamentar Alberto Fraga (DEM-DF), foi acusado de agredir uma estudante. Ele negou. A polícia então disparou spray de pimenta na sala. A sessão foi retomada em outra local, a portas fechadas. Na saída do Congresso, houve nova confusão entre estudantes e Polícia Legislativa, que voltou a disparar gás de pimenta contra os manifestantes.
“Responsabilizo o deputado André Moura e o presidente da Casa, Eduardo Cunha, do PMDB-RJ, [o principal defensor da proposta] pelo que aconteceu aqui. Ele [Cunha] se transformou em um ditador nessa Casa, um pequeno ditador, pequeno em suas ideias”, protestou a deputada Maria do Rosário (PT-RS). A petista disse ser contra a redução linear da maioridade, mas defendeu maior tempo de internação para menores que cometem crimes graves, proposta também defendida pelo PSDB.
Já o deputado Éder Mauro (PSD-PA) ressaltou que a discussão sobre a redução da maioridade penal no Congresso já dura mais de 20 anos. “Não é possível que alguns ainda queiram esconder o que está aí. A questão que estamos tentando trazer aqui é a do jovem bandido, do jovem de 16, 17 anos que fez a escolha para ser bandido. Não estamos falando do jovem de bem.”
Gás de pimenta
Moura afirmou que a confusão foi provocada pela “baderna e anarquia” iniciada, segundo ele, pelos estudantes. “Não sei o porquê do gás de pimenta, mas esse fato lamentável nos levará a votar na semana que vem só com a presença de parlamentares e a imprensa. Os manifestantes mostraram que não sabem se comportar de forma respeitosa com os deputados”, afirmou.
O presidente da Câmara avalizou o trabalho da Polícia Legislativa e disse que também impedirá a entrada de cidadãos nas galerias do plenário durante a votação do tema. “Isso é uma bagunça que a gente não pode permitir. A TV Câmara transmite e todo mundo assiste, não são cem pessoas que vão formar a opinião de 200 milhões”, disse Cunha, acrescentando que não irá interferir no trabalho da polícia da Casa, ao ser questionado sobre o uso de gás de pimenta. “Dou autonomia à polícia.”
Deputados do PT afirmaram que alguns estudantes tiveram que receber atendimento médico. Outros foram levados pela Polícia Legislativa para prestar depoimento.
Crimes hediondos
Além de defender a redução da maioridade penal para 16 anos, a PEC apresentada por Bessa estabelece que os jovens de 16 a 18 anos terão que cumprir pena em unidades diferenciadas ou nas atuais casas de ressocialização. O principal apoiador da proposta, entretanto, é Cunha, que anunciou a votação do tema no plenário da Câmara no dia 30 deste mês.
Em reação a uma tentativa de aliança entre PT e PSDB para barrar a aprovação do projeto pelo Congresso, Cunha começou a articular uma contraofensiva. Ele irá apoiar a proposta do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) de que a redução só ocorra em casos de crimes hediondos.
Cunha não apoiará qualquer decisão do Congresso para que o tema só entre em vigor após ser referendado pela população, em outubro de 2016. Com o recuo, eventual alteração feita pelo Congresso entrará em vigor imediatamente. (Folhapress)
Publicado em O Sul