“A intolerância tem crescido extremamente” no País
As posturas defendidas por Maria do Rosário (PT/RS) não deixam dúvidas de que a bandeira feminista é uma das frentes de luta da deputada federal. A parlamentar foi, na última semana, assunto nas redes sociais após o apresentador Danilo Gentili receber notificação judicial que solicitava manifestação sobre agressões verbais contra a gaúcha. Gentili recortou a notificação e a esfregou nas partes íntimas.
Sobre o ato de provocação de Gentili, Maria do Rosário tem preferido o silêncio. Procurada pelo O POVO, ela disse, por meio de sua assessoria, que “o assunto está sendo tratado na esfera judicial”. Essa, entretanto, não é a primeira vez que ela é alvo de misoginia.
O deputado federal Jair Bolsonaro (PP/RJ) é réu em ação que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) movida pela ex-ministra. Na última quinta, 1º, o militar reformado foi notificado pelo ministro Luiz Fux e tem até a próxima terça, 6, para apresentar defesa.
Em entrevista concedida no final de abril, na Câmara dos Deputados, em Brasília, Maria do Rosário falou sobre a Operação Lava Jato, o ex-presidente Lula, preconceito no Congresso e os ataques recentes contra sua filha. Leia abaixo os principais trechos da conversa.
O POVO – O STF aceitou denúncia, tornando o deputado Jair Bolsonaro réu por incitação ao estupro e injúria. Como vê essa decisão?
Maria do Rosário – Esse processo simboliza a busca de que tenhamos o fim da agressão, seja ela verbal, física, psicológica, contra todas as mulheres brasileiras. É triste, mas são agressões que estão sendo aceitas por uma parcela da população, que aplaude isso. Portanto, eu acho que o STF ter referendado a existência do processo nos fortalece ainda mais de que nós estamos no caminho certo e que é ilegal e inconstitucional o ataque a qualquer mulher ou a qualquer pessoa como foi feito naquele episódio.
OP – As mulheres têm atualmente menos de 10% de assentos na Câmara dos Deputados. O que esse número representa?
Maria do Rosário – Esta representação feminina no Congresso Nacional está estagnada há várias eleições. Além de enfrentarmos a máquina eleitoral e a disputa em si, enfrentamos uma visão de que este universo da política é um universo público que não nos pertence. E, mesmo no século XXI, reproduz-se uma visão majoritária na sociedade que quer nos colocar nas quatro paredes de uma casa. Em mais de oitenta anos da nossa presença aqui, nós nunca ultrapassamos 10%.
OP – E as políticas de direitos humanos do governo Temer?
Maria do Rosário – Ele não trata, não reconhece a gravidade das violações aos direitos humanos que nós temos nos dias atuais no Brasil. E esse reconhecimento é premissa essencial para evitar as violações num campo contra os sem-terra ou contra os trabalhadores rurais, a violência contra os índios, urbana nas periferias contra os negros e negras que são mortos, contra as mulheres.
OP – O Brasil vive tempos de intolerância. Pode falar sobre isso?
Maria do Rosário – A intolerância tem crescido extremamente. É absurdo alguém ser morto – como Dandara – por ser alguém que tinha na sua identidade sexual a diversidade que não era dentro dos padrões heterossexuais. A lei parte do princípio de que todas as pessoas são iguais.
OP – A senhora acredita que o ex-presidente Lula tem apoio como candidato para 2018?
Maria do Rosário – Nós vamos levar Lula até as eleições. Lula também sofre a intolerância e é isso que ele está sofrendo. Uma parte das elites nunca aceitou um nordestino, pobre, sem um dedo. Não se ouve sobre Lula nada que seja objetivo. Acho que Lula vai se fortalecer enormemente com os trabalhadores porque o único caminho para revogar essa reforma trabalhista é Lula. Nós somos Lula e ele é quem nos representa.
OP – A senhora é citada na Lava Jato. Pode falar sobre isso?
Maria do Rosário – Quero dizer sobre isso que ela (a citação) não tem nada a ver com outras denúncias de corrupção que são feitas contra outros parlamentares. Eu tenho convicção e todos os argumentos legais para dizer que aquilo foi uma mentira que alguém usou para se livrar da condição em que estava, de meses de prisão, e que esses delatores muitas vezes dizem o que alguém quer ouvir do outro lado.
OP – Acha que os ataques contra sua filha (ela foi vítima de ódio na internet após ter fotos adulteradas) relacionam-se com sua atividade parlamentar?
Maria do Rosário – Sim. Não conseguiram me calar com todos os ataques que existem aqui e nas redes. E pegam o que é mais sensível: a responsabilidade que eu tenho de proteger a minha filha. Atingindo a minha filha, eles querem dizer que eu sou uma mãe que não cuida da minha filha e repetem subliminarmente que o lugar de uma mulher não é na Câmara, que é dentro de casa cuidando da sua filha.
O meu lugar é com a minha filha e dentro da Câmara. Quero que ela saiba que, em qualquer lugar, ela pode estar e deve ser respeitada. O ataque nas redes também acontece no shopping, num ponto de ônibus, porque eles divulgaram o rosto dela. Não deixo minha filha em casa com meu marido para vir bater tapinha nas costas de nenhum sem-vergonha que pense que é melhor que eu. E é isso que eu tenho que dizer para as mulheres brasileiras: não se dobrem. Não se diminuam. Vocês têm muito poder.
Kelly Hekall
Publicado em: O Povo