Os bastidores da decisão de Maranhão
Por Maria do Rosário Nunes*
Sinceramente, isso não é o mais importante. O relevante é que a decisão de Maranhão faz com que o golpe se desmascare ainda mais. Este impeachment é inconstitucional, um claro ataque ao Estado de Direito, um desrespeito ao resultado das eleições de 2014, uma decisão tomada sem fundamentos jurídicos e por procedimentos eivados por vícios insanáveis. Agora, é saber como as peças irão se movimentar nas próximas horas e dias.
As primeiras reações dos que defendem o golpe foram imediatas, estão em marcha e centram-se em três argumentos principais. O primeiro é de que o presidente da Câmara dos Deputados é interino, e por isto seria desconhecido e despreparado. Buscam desqualificá-lo para desviar o foco e diminuir a seriedade e o peso político para a democracia brasileira que possui sua decisão.
Em um segundo argumento, buscam usar a repercussão da medida que anula as sessões na Câmara, para reduzir o impacto que a consciência do “golpe” causou na população brasileira. Ou seja, querem desfazer a clara e crescente percepção, desde a votação de 17 de abril no Plenário da Câmara, de que o processo contra a presidenta Dilma é fruto de um condomínio de interesses de Temer, Eduardo Cunha e sociedade anônima. Para isso tentam apresentar como legítimas e democráticas suas ações e “precária” a decisão de Waldir Maranhão. Pura falsidade dos que não conseguiram responder qual o crime de responsabilidade a presidenta Dilma teria cometido.
No terceiro argumento, procuram ilustrar manchetes do mercado financeiro e da imprensa internacional como se a decisão de Maranhão tivesse criado um novo “quadro de instabilidade” para o país, gerando uma ideia de que apenas o caminho do impeachment resgataria a estabilidade institucional e a boa reação da economia. Nova falsidade. A instabilidade econômica do país está associada à movimentação golpista, que paralisou a economia e investiu na lógica do “quanto pior, melhor”, desde a vitória de Dilma no 2º turno.
Ora, é importante afirmar que a melhor saída institucional e de estabilidade para o país é a própria democracia, e não sua derrubada. É isto o que está acontecendo durante todo esse processo. De forma clara e objetiva, não existiu crime de responsabilidade. Se as pedaladas fiscais o fossem, 16 governadores deveriam ser afastados.
Nos últimos dias, Dilma tomou medidas absolutamente importantes. Foram cinco novas universidades federais anunciadas. Nos últimos dias, a renovação do Mais Médicos; a terceira fase do Minha Casa, Minha Vida; a correção da tabela do Imposto de Renda; o reajuste do Bolsa Família, entre outras medidas significativas.
Aliás, qual estabilidade possível proverá Temer ao país, se os próprios jornais de hoje noticiam que, se um golpe prevalecer, o mesmo poderá anunciar ministérios incompletos, pois não está conseguindo formar sua própria equipe? E os seus indicados, não estão denunciados em várias das operações em curso? A maioria dos que apoiavam este caminho já começa a repensar, não quer embarcar em uma grande aventura. Afinal, onde foi parar o “ânimo” social com o impeachment? Sumiu?
Qual a garantia de estabilidade possível proverá Michel Temer, implantando do alto de sua ilegitimidade sem voto, um programa distinto daquele que escolheram os 54 milhões de brasileiros e brasileiras que votaram em Dilma?
Os primeiros anúncios dão conta de alterações nas leis trabalhistas; priorização da educação fundamental em detrimento dos outros níveis de ensino e programas como o Prouni e Ciências Sem Fronteiras; a desvinculação das receitas da União nas áreas de educação e saúde, que promoverá forte queda dos investimentos nessas áreas; amplo programa de privatizações e concessões danosas ao país, além de outras medidas nocivas aos avanços sociais obtidos nos últimos tempos.
Enquanto escrevo estas linhas, vejo que a ministra Rosa Weber, do STF, negou recurso contra a decisão do presidente da Câmara, ao mesmo tempo em que Renan Calheiros, no Senado, desconsidera e dá sequência ao processo do golpe do impeachment. A cada dia, nova “emoção”. As peças se movimentam. Assistimos à judicialização da política e a politização do Judiciário. Triste. Seria muito mais simples preservar a democracia.
* Maria do Rosário Nunes é deputada federal (PT/RS)
Publicado em Revista Fórum