Crônica do golpe
Por Maria do Rosário Nunes*
Esta semana, a nação assistiu perplexa ao acatamento do pedido de impeachment da presidenta Dilma, na Câmara dos Deputados. Todos sabemos que trata-se de um golpe. Eduardo Cunha, o presidente da Câmara que está desmoralizado diante do país, sentiu-se à vontade para agir contra a democracia, fazendo prevalecer seus próprios interesses e de setores retrógrados.
É o ápice de uma série de arbitrariedades que ocorreram neste ano de 2015, um dos períodos mais difíceis para a política brasileira desde a redemocratização. Mas a perplexidade não é fruto do acaso. Pensávamos que valores democráticos estariam consolidados no Brasil, no entanto desde o 2º turno das eleições de 2014, a prática política rasteira conduzida pelo PSDB vem solapando a democracia. E após as eleições, os que perderam nas urnas impuseram ao país um interminável 3º turno.
A deflagração do pedido de impeachment contra a presidenta Dilma apenas confirma esta trajetória infame. Ocorre como vingança sórdida, diante da rebeldia cívica do PT de não oferecer seus votos no Conselho de Ética à salvação de Cunha.
Resta saber se o PSDB vai prestar-se ao papel de ser tábua de salvação, votando contra a admissibilidade do processo contra Cunha no Conselho. Seria mais um capítulo na degeneração moral de seus quadros.
Desde o primeiro momento existe uma aliança entre Cunha e o golpismo tucano. Estiveram abraçados nas piores propostas legislativas durante o ano e consolidaram uma relação aética, cujo único interesse é aprofundar a crise em curso no país. Fazem jus à sua própria consistência política: interesseira, preconceituosa e medieval.
Exemplos dessa aliança estão nos projetos apoiados por Cunha e pelos golpistas que fazem oposição ao governo Dilma.
Desde a proposta de terceirização e precarização para os trabalhadores do PL 4330, até o estatuto do preconceito que destrói diversas famílias brasileiras, passando pelo Projeto de Lei 5069/13, que violenta os direitos das mulheres e pela tentativa de acabar com o estatuto do desarmamento, o conjunto de objetivos da oposição é fortemente prejudicial à sociedade brasileira.
É preciso barrar o golpe porque muito mais está em risco. Das políticas inclusivas de milhões de brasileiros até as riquezas mais importantes para o país, como as que são asseguradas pelo regime de partilha do Pré-Sal e o papel da Petrobras em sua exploração.
No momento em que o Brasil precisa reagir a uma complexa situação de desaceleração na economia – quando estamos diante de um descrédito geral nas instituições, fruto do amplo e inédito conhecimento de atos nefastos de corrupção – a oposição, ao invés de agir para oferecer condições à superação de problemas, prefere a ação golpista e busca aprofundá-los em seu próprio interesse.
Quem age assim não se preocupa com as brasileiras e brasileiros, pois cedeu à lógica do “quanto pior, melhor”, e repassa ao povo a conta desta tentativa de golpe irresponsável que realiza.
A legalidade e a democracia não são meros detalhes. A Constituição de 1988 não é peça descartável. Um impeachment sem fundamento representa a quebra do princípio de soberania do voto popular e acatamento do resultado das urnas. O que está colocado neste momento é a ruptura com a democracia, que foi tão arduamente conquistada às custas de vidas e sonhos interrompidos durante a ditadura militar.
Neste contexto, precisamos de forças conscientes para barrar a investida golpista em curso. É hora de ter lado, enfrentar a grave situação com coerência e posicionar o governo novamente nos trilhos do projeto para o qual foi eleito em 2014.
Maria do Rosário Nunes é deputada federal (PT-RS)
Publicado em Revista Fórum